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Conheça os desafios da comunidade surda e o que a UFT tem feito para atendê-los

Por Virgínia Magrin | Publicado: Sexta, 20 de Setembro de 2019, 12h20 | Última atualização em Sexta, 20 de Setembro de 2019, 14h54

Imagina você chegar em sala de aula e todos estarem se comunicando em uma língua que você não domina? Imagina se o conteúdo fosse passado nessa língua. Com certeza é uma situação bem difícil, mas enfrentada por muitos surdos no Brasil. Mariana Ferreira Albuquerque, primeira aluna surda a se formar pela UFT, em Araguaína, enfrentou esses desafios, para que outras pessoas como ela tivessem acesso a um ensino cada vez mais inclusivo.

Em 2012, quando Mariana passou no Vestibular em Araguaína, para Cooperativismo, a UFT ainda não tinha intérprete da Língua Brasileira de Sinais (Libras). “Os principais desafios foram em relação à questão da comunicação. Professores só oralizavam e poucos entendiam minhas limitações como surda. Libras tem uma gramática diferente então tinha algumas dificuldades com as provas preparadas pelos professores”.

Com a demanda surgida, a UFT abriu concurso para tradutor intérprete de língua de sinais. E hoje já conta com três interpretes concursados em Palmas, um em Miracema, um em Tocantinópolis, dois em Araguaína, um em Arraias, dois em Gurupi, dois em Porto Nacional, além de outros três contratados no Câmpus de Porto Nacional.

E a acadêmica Mariana? Continua estudando, já se formou em uma outra faculdade no curso de Pedagogia, trabalha como professora e atualmente voltou para a UFT, agora no Mestrado em Letras: Ensino de Língua e Literatura. “Hoje a UFT já conta com intérpretes concursados, então facilita pra quem entra, diferente de quando comecei. Além disso, a UFT disponibilizou vagas para surdos no mestrado”, comemora ela, reconhecendo as melhorias e pontuando os desafios: “Faltam pesquisas na área da surdez, então o avanço ainda é lento”.

Sérgio Gomes também enfrentou vários desafios ao ingressar na faculdade, ele foi o primeiro surdo a passar no vestibular, no Câmpus de Palmas. Foram nove tentativas até ser aprovado e no início deste ano ele recebeu o diploma de pedagogo. Ao contrário de Mariana, no Câmpus de Palmas já existia intérprete de Libras.

Ações

A UFT desde 2008 tem adotado ações de consolidação de práticas que garantam a inserção e a permanência das pessoas com deficiência no Ensino Superior. Implantou o  Núcleo de Inclusão e Acessibilidade do Deficiente (Niad), há interpretes de Libras para atender a demanda de alunos surdos e professores em todos os câmpus, aderiu a programas como o Incluir, Viver sem Limites, o Programa Nacional de Assistencia Estudantil (Pnaes) e o Programa de Acessibilidade e Educação Inclusiva (Paei).

A UFT ainda oferece cursos de formação voltados para a comunidade universitária e servidores, com o objetivo de qualificar os servidores em Libras para atender a comunidade surda interna e externa. Conta com o atendimento educacional especializado, identificando as barreiras que cada um enfrenta individualmente. No âmbito das bibliotecas tem implantado o Setor de Acessibilidade Informacional (SAI).                                      

A Universidade também está instituindo o Comitê de Acessibilidade da instituição, que será responsável pela articulação da politica de inclusão de todos os câmpus e criando o protocolo de atendimentos. “O protocolo vai garantir que os alunos com deficiência  tenham pleno desenvolvimento em suas atividades acadêmicas. Assim, com umas das ações, a UFT passa por um momento de adaptação de seus documentos institucionais que contemplem os direitos das pessoas com deficiência, desta forma, debaterá junto com as pró-reitorias, coordenações de cursos e comunidade universitária, os procedimentos para o atendimento educacional especializado desse grupo de estudantes,  debatendo sobre novas  metodologias e avaliação, que considerem  as especificidades, o tempo, o tipo de deficiência , melhorando o  processo de ensino aprendizagem dessas pessoas”, explica Manoel Mendes, pedagogo que trabalha no setor de acessibilidade da UFT.

Mas ainda sem ter sido implantado efetivamente, esse atendimento já acontece. Maxwell Cunha, tradutor interprete de Libas do Câmpus de Palmas, explica que os alunos que entram com alguma deficiência, são atendidos e ouvidos. “A gente levanta as necessidades deles, faz as adaptações e orientas os professores e colegiados. Há surdos, por exemplo, que fazem leitura labial e os professores precisam falar de frente para ele e de forma mais pausada”, esclarece Cunha.

Licenciatura em Letras-Libras

Esses avanços podem ser vistos na própria criação do curso de licenciatura em Letras-Libras, do Câmpus de Porto Nacional, que nasceu com a perspectiva de suprir a demanda de intérpretes no estado. Seu objetivo principal é formar docentes para atuar no ensino da Libras, como primeira e segunda língua nos níveis Fundamental II e Médio.  Além disso, os formados nesta licenciatura podem atuar no mercado de trabalho como produtores de textos de diferentes gêneros e registros linguísticos, fomentando o desenvolvimento de habilidades linguísticas, culturais e estéticas. Após a pós-graduação, podem, também, atuar como professores no Ensino Superior.

A UFT foi pioneira no estado em criar o curso em 2015. A primeira turma se formou no início deste ano. Oito alunos receberam seus diplomas, entre eles três eram surdos e cinco eram ouvintes. Além deles, outras duas pessoas também se formaram, mas fizeram a colação em gabinete.

O professor e ex-coordenador do curso, Renato Jefferson Bezerra Leão é surdo e conhece na pele as dificuldades enfrentadas na formação de alguém com deficiência auditiva, afinal, se não fossem seus pais o incentivando a não deixar os estudos, talvez ele tivesse desistido. “Quando soube do curso e da necessidade de ter professores surdos no quadro docente, gostei da proposta e resolvi me mudar para o Tocantins”, explicou ele.

Leão conta que é importante ter referencias surdos no curso e que atualmente, dos 17 professores, nove são surdos e oito são ouvintes. “Temos o desafio de termos salas com surdos e ouvintes, dois públicos que compartilham línguas diferentes. Neste caso, os intérpretes fazem a interpretação da Libras para o português, porque a maioria dos professores  ministram em Libras”, destacou o professor.

Desde então alunos surdos de vários estados tem buscado o curso para se capacitar. Apesar dos desafios, as turmas têm aprovado o conteúdo ministrado e se colocado no mercado de trabalho após a formação. 

Pioneirismo

Tal como a acadêmica Mariana, Roselba Gomes de Miranda também abriu caminhos na UFT. Foi a primeira professora surda a passar em um concurso na instituição. Tomou posse em 2013, no Câmpus de Tocantinópolis e como ainda não tinha interprete no câmpus, teve dificuldades de comunicação. Dois anos depois de sua posse ela foi para o Câmpus de Araguaína, onde contribui para quebrar barreiras na sociedade. “Depois soube que aumentou o número de alunos surdos em Porto Nacional, recebi convite de transferência e há 1 ano e meio moro em Palmas”, conta Roselba.

Ela que é chamada de mãe por todos os alunos surdos, se emociona ao lembrar de sua história: “Cheguei no Tocantins há 13 anos e a ideia que se tinha era que os alunos surdos não tinham capacidade. Hoje cada um dos formandos se tornam modelos para futuros estudantes surdos. Parabenizo a todos surdos e ouvintes pelo esforço na graduação”.

Roselva acredita ainda, que as conquistas não vão parar por aí e muitos desafios ainda serão superados: “Eu acredito que UFT vai avançar mais ainda na acessibilidade dos surdos, que a instituição estará adaptada do português para Libras nas provas, nas atividades e em tudo mais que o surdo precisar”.

Integração entre intérpretes e surdos

Parte importante da acessibilidade dos surdos, são os interpretes, que na maioria das vezes perpassam a relação de trabalho para fazer parte do dia a dia do aluno. Anderson Carvalho da Silva, primeiro tradutor interprete de Libras a tomar posse na UFT sabe bem disso. “Nossa função principal é interpretar as aulas para alunos surdos do português para Libras, ou vice e versa, mas essa atividade se mistura. Os alunos também precisam se comunicar com os colegas, fazer trabalhos, encontrar o professor, até no intervalo temos que estar com eles. Ajudamos no preenchimento de formulários, busca por direitos e até em consultas médicas. Tudo isso exige uma ética e um compromisso muito grande”, explica ele.

Como todo pioneiro, ele também enfrentou desafios: “Quando cheguei na UFT em Palmas tive dificuldades até para saber onde eu iria, onde iriam me lotar. Na época não tínhamos surdos e a intenção era preparar para a chegada deles. Começamos a disseminar Libras por meio de cursos de extensão”.

Com o tempo e as experiências com os surdos que iam entrando, todo o convívio, as coisas foram melhorando. A UFT investiu ainda mais em acessibilidade. “A gente foi vendo as necessidades dos surdos e direcionando. Aos poucos fomos montando os Núcleos que davam suporte a essas pessoas e novos servidores foram tomando posse”, lembra ele.

Se ele é feliz com o que faz? Com certeza! “Gosto, pois estou ajudando os surdos a terem condições de aprender, de disputar o mercado de trabalho, de ter uma estrutura, uma formação, de condições equiparadas aos ouvintes, pois eles passam por muitas dificuldades desde a infância, são incompreendidos por serem filhos de pais ouvintes. Vejo que muitos, quando chegam à universidade e descobrem que tem um interprete, mesmo cansados eles sentem-se aliviados e alegres. Isso é recompensador”.

Extensão Arraias

Os trabalhos realizados nessa área não param por aí. Vinícius Pedroni também realiza, desde o ano passado, o projeto de extensão "Aquisição da Língua Brasileira de Sinais por crianças, jovens e adultos através do conhecimento, da identidade e cultura surda", no Câmpus da UFT em Arraias.

O trabalho realiza encontros semanais na UFT com surdos da cidade. “Muitos alunos, antes desses encontros, mal conseguiam se comunicar com suas famílias, utilizando alguns gestos soltos,  sem conseguirem realmente se expressar. Isso prejudicava o desenvolvimento deles até na escola”, explica Pedroni.

A intenção é expandir ainda mais o trabalho, pois, segundo o professor, existem surdos que moram em comunidades um pouco distantes da UFT e por isso eles ainda não conseguiram acessá-los. “Estamos conseguindo ajudar a desenvolver surdos da cidade de Arraias e queremos expandir para as comunidades e cidades próximas. A intenção é ajudar no desenvolvimento linguístico e na acessibilidade dos surdos da região que não tinham conhecimento da língua”, garante Pedroni.

Setembro Azul em números

Setembro é o mês usado para comemorar e alertar sobre as lutas dos movimentos surdos. Conhecido como Setembro Azul ou Sembro Surdo, o mês marca a luta da comunidade surda por seus direitos. Na UFT existem 215 alunos vinculados com algum tipo de deficiência, desses, 62 são surdos ou tem deficiência auditiva.

Entre os técnicos administrativos, são 39 com algum tipo de deficiência, sendo que há 02 parcialmente surdos. Já entre os professores são 13 surdos e 1 um com baixa visão.

 

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